Sunday, October 30, 2005

Chuva molhada na terra seca de um local ermo. Pinta o chão com as cores da noite e traz um sabor a Inverno. Sei que vem aí o Inverno, anuncia-se nos tons cinzentos do céu, e traz-me o augurio de tempos tristes. Os oráculos veêm aves negras a voar em circulos nos céus tempestuosos. Há trovões que cospem raiva contra os meus erros, todos os meus delitos secretos.
Inverno dos meus medos. Aproxima-se, e o que mais me assusta não é a bifurcação dos caminhos, não é uma escolha... é a ausencia do meu poder perante o meu destino, é a neblina que encerra o campo de visão que não me permite ir para além dos meus dias contados. A noção que tudo isto caminha para um fim e a cada dia que me levanto restam-me menos 24 horas.
"Caminhamos a direito como cegos."

Saturday, October 29, 2005

A Exceção e a Regra

"Estranhem o que não for estranho.
Tomem por inexplicável o habitual.
Sintam-se perplexos ante o cotidiano.
Tratem de achar um remédio para o abuso
Mas não se esqueçam de que o abuso é sempre a regra."
By Bertolt Brecht

Voando sobre este Ocaeno

"Meu corpo e minha alma num sonho se completam
Com as vossas mentiras, por Deus, não me dispertem.
Não sou daqui, habito um pássaro inocente
Consome-me o seu voou voraz e intermitente"

by René Obaldia

Thursday, October 27, 2005

Tendencias Suicidas


"Sempre tive tendencias suicidas: nunca me importei muito de viver ou de morrer, mas acontece-me muitas vezes considerar a morte como o fim de todos os tormentos. O facto é que a morte também me mete medo..."
by Kurt Cobain

LAST DAYS


Uma pérola do cinema de autor. Uma reliquia para os admiradores. Um trablho espantoso de interpretação.
O mito Kurt Cobain prova a a sua actualidade. O rito, que adoptou a forma de uma pelicula, actualiza o mito, Kurt, disfarçado sob o nome de Blake. A grandeza de um espírito que procura a liberdade nos atalhos que precedem a morte. A inigualável personalidade, que seduziu os acordes da guitarra e a melodia rouca de uma voz marcada pela autonomia criativa. Um Hamlet do nosso século. Um verdadeiro Prometeu, que se queimou na chama do fogo sagrado.

Bono Evangelista


"Nas minhas cancões procuro exprimir-me a mim proprio, o meu mundo interior: aquilo que eu sou, quilo que eu sinto... Não tenho intenção de difundir mensagens de protesto nem de redenção universal. Não um daqueles pregadores-rock de merda que proclamam uma qualquer "iluminação filosófica" ou que afirmam ter visto uma Luz Divina qualquer; de resto, no mundo do rock, para coisas deste género já existe Bono, oEvangelista..."

by Kurt Cobain (excerto de Odeio-me e quero morrer)

Sunday, October 23, 2005

Batatas com bacalhau e ovo

O meu almoço (Sim!, porque já sou expert nestas andanças)
  • descongela-se o bacalhau que a minha mae mandou, previamente demolhado.
  • Descascam-se as batatas (não importa se fica uma pelizita ou outra, porque é um óptimo tempero)
  • colocam-se as batas e o bacalhau no tacho, com sal (acho eu...), e deixa-se no máximo até ferver altura em que baixamos o lume para o minimo
  • nos entretantos, já se pôs noutro tachinho um ovo com a agua fria (para o ovo nao rebentar), onde fica a coser dez minutos
  • quando as batas já estiverem cozidas q.b. (reparem como sou um cozinheiro a sério que até usa estas expressão fabulosa: q.b. - gosto muito!) é só por tudo no prato a acompanhar com azeite. Se for um dia especial, ou se nao tiverem nada de importante para fazer à tarde, acompanhem este manjar dos deuses com um vinho tinto, que é como o meu pai gosta.

Tom 1ª Parte

Derrepente apereceu. Apareceu-me. Saiu da minha boca e cuspiu a sua natureza bruta. Entrou-me nos braços, que ganharam vida, nas pernas, que permaneceram fortes, presas ao chão, e invadiu-me o olhar. Desapareceu este que voces conhecem e ficou um olhar marcado, forte, negro como o petróleo. Uma ganancia desesperada pululou-me nas veias, e surgiram-me sonhos de uma grandeza incomensurável: "um rancho, com milhares de cabeças de gado"; dinheiro, "uma casa de jogo"; "minas de cobre e plantações de ananáses"; "uma enorme mansão no sul, cheia de pin-ups de todas as cores". Estas imagens tornaram-se o meu sonho, este sonho o motivo da minha saida.
Parece que nasceu, pode até ser só um embrião, mas agora vai crescer, no caminho certo. Vai crescer, como eu, que também vou crescer, mesmo que não deêm por mim, mesmo que não tenha graça, mesmo que só apareça no principio e no fim.
São as minhas pequenas conquistas, passo a passo, pequenas, mas tão sofridas!

Saturday, October 22, 2005

Bilbioteca...











de Vieria da Silva
"Enquanto me aproximava sentia o calor do seu corpo. Sentia os seus tecidos, aquele pele que fervia e me chamava.
As nossas mãos tocaram-se e, nesse instante, qualquer coisa dentro de mim fervilhava e explodia, num extase inexplicável. Movidos por uma força imune à nossa vontade os corpos aproximaram-se, e descobriram todas as suas carencias na candura do outro. Trocámos de corpos e brincámos com a vida. Quebrámos os nossos ultimos limites nas horas mais curtas da minha vida. Perdemos a noção do tempo, perdemos a noção do espaço e perdemo-nos um no outro. O peso da minha existencia solitária tinha sido aliviado pela partilha total do meu ser, e por momentos senti-me livre."

Friday, October 21, 2005

The Plague

"It is not rebellion itself which is noble but the demands it makes upon us."

Albert Camus

Thursday, October 20, 2005

Dear Teri!


E quando tomamos cafés, enquanto eles vao às compras... e quando fumamos na tua dispensa, à noite, é espera que alguém chegue dos treinos... e quando temos conversas filosofico-metafisicas... e quando dizemos "browners" cheios de orgulho na diferença da nossa vulgar cor... e quando debatemos os nossos problemas embrenhados em resolvê-los... e quando te encontrei com o teu lenço amarelo esvoaçante... e quando repetimos um "lá está" sistematicamente... e quando me dizes que já nao sabes o que fazer...
Espera um bocadinho até à proxima 2ª feira!

Wednesday, October 19, 2005

Bi-polaridade

Só espero não cair deste fio de arame. A lantejola presa no meu cabelo brilha com a intensidade dos projectores. E todos os dias me mascaro para, quando chego a casa, voltar a ser eu sem pintura, e qual destes é o verdadeiro?
A inconstancia reina neste universo fantastico em que me perdi. A qualidade efémera destas luzes que me iluminam mostram-me o sitio onde me posso encontrar. Uma batalha comigo é travada todos os dias, todas as noites. Se subo ao arame só duas possibilidades: manter-me ou cair. Se caio, parto-me, e fico partido até tentar outra vez. Se me mantenho... aguardo, mais forte, a próxima caida.

Tuesday, October 18, 2005

The Marriage of Heaven and Hell

"Prisons are built with stones of Law, brothels with bricks of Religion."

By William Blake

I'm with you, Jim!

"If the doors of perception were cleansed everything would appear to man as it is, infinite."
By William Blake

Saturday, October 15, 2005

A Epidemia da Revolução

Parece que de repente toda a gente fala em revolta. A revolta tornou-se uma epidemia. Através do associativismo ou por iniciativa solitária, o que interessa é o "avant garde", numa filosofia quase vanguardista: romper com o passado e fazer tudo de novo.
Quando me entra pelos ouvidos parece tão bonito, e não consigo deixar de pensar nisso (acabei de ouvir, como dá para perceber). Mas acabei de me aperceber que este assunto tem-me aparecido de uma forma quase obecessiva, constantemente, em todas as conversas e programas que vejo na tv ou livros que leio. E esta ideia não me sai da cabeça...
Vamos unir-nos, vamos fazer tertulias com poetas e compositores malditos. Vamos fazer diretas a conversar sobre o futuro do país ou mesmo o nosso futuro. Vamos exaltar-nos contra a apatia e contra a alienação. Vamos ver filmes de autor. Vamos fazer manifestações. Vamos publicar textos activistas. Vamos... vamos... vamos... para a cama, que é o melhor!

Thursday, October 13, 2005

Auguries of Innocence

To see a world in a grain of sand
And heaven in a wild flower
Hold infinity in the palm of your hand
And eternity in an hour.

by William Blake

alterações prosipitadas

Enrola-se em torno de mim o quarto apertado. Os sons multiplicam-se numa voz indistinta e ecoam na minha cabeça como se me entrassem no corpo e explodissem dentro de mim. A fome aperta-me o estomago e com a boca incendeio o ecran do computador. Fumo um cigarro amargo que parece não ter fim. Parece que ultrapassa a parede do quarto ate romper o céu com a sua ponta de fogo. As luzes e as cores trazem reflexo de arco-iris. As palpebras pesam, cansadas, sobre a retina desértica dos meus olhos sem pupila.
Queria permanecer estável, mas a instabilidade dentro de mim ultrapassa as minhas fronteiras mórficas e inunda-me e afoga-me neste rodopio. Já não consigo respirar... esta é a ultima lufada antes da queda.

Heavy Moments by me

O Beijo

É o que eu chamo realismo psicológico, acho eu...

by Chagall

O Futuro Já Começou!

Vamos falhar, todos juntos e ao mesmo tempo. Vamos errar, cair e tropeçar em nós mesmos. Depois levantamo-nos e parecemos maiores que os outros todos que nunca cairam. Não tenhamos medo do ridículo e do riso dos outros que, na sua maioria, perderam a vida a recear-se. Não nos podemos recear, nunca! Temos que alcançar o horizonte móvel que é o limite de nós mesmos.
Vamos à luta, despojados de preconceitos e manias, tabus de uma sociedade da imagem de plastico:bonita, mas oca.
Todos juntos formaremos uma nova soiedade unida na individualidade pessoal de cada um de nós. Sem medo, porque o futuro já começou.

Wednesday, October 12, 2005

Helena Almeida

to the missing friend

Encontrámo-nos outra vez. Sintonizámo-nos na mesma frequencia envoltos no ritmo leve de um jazz desconhecido. Caminhámos a compaço pelas calçadas esquecidas e cansadas. Era noite que nos encaminhava cada vez mais para dentro de nós. E nós deixávamo-nos ir.
Ouvimo-nos e regressámos a lugares distantes por nós conquistados. Mas enquanto acendiamos um cigarro e bebiamos um copo, nunca nos esquecemos de ti!
Continuas sempre presente. Continuas conosco quando nos encontramos e quando estamos sozinhos. Continuas a aliviar os momentos de pressão, a fazer birras porque andamos muito depressa, a dançar à nossa frente enquanto, desajeitados, te tentamos imitar. Fazes-te refém dos nossos pensamentos e partilhas conosco a algria de nos reencontrarmos.
De qualquer forma, temos saudades tuas!

Monday, October 10, 2005

manifesto Prometeico

Deixem-me estar aqui, sózinho. Não quero saber!
Não preciso das vossas opiniões, ou das vossas certezas. São vossas, só a voçês servem. E não me interpretem mal, isto não é falta de humildade.É só a necessidade de descobrir o meu caminho, descobrir as minhas certezas e ser feliz.
Não me digam que não posso acreditar nos meus sonhos.
Vou sózinho aos céus buscar o meu fogo sagrado. Roubá-lo-ei aos meus deuses desconhecidos e com ele iluminarei o meu caminho, agora obscuro, incerto e até assustador.
E se me encontrarem, mais tarde, agrilhoado a uma falésia com necrófagos e comerem-me o corpo, não tenham pena. Porque pelo menos fui eu que levantei o meu facho na noite escura!

Sunday, October 09, 2005

American Dream


Tom - "... terei um rancho com milhares de cabeças de gado (...) ganharei tanto dinheiro que não precisarei de fazer mais nada (...) Tenciono abrir uma casa de jogo e comprar minas de cobre e plantações de ananases.Terei uma enorme mansão no sul Cheia de pin-up's de todas as cores."

O Vanto nas Ramas do sassafrás by René Obaldia

Friday, October 07, 2005

Malha de Incerteza(s)

Não sou nada, ainda não existo, sou poeira cosmica num universo infinito em cuja maioria da população não passa de sombras. Mantenho-me calado e espectante e, para vergonha do meu orgulho agnóstico, tenho que ter fé. Preciso dessa água, senão desidrato até à morte neste deserto do medo e da inconstancia.
Não me posso alegrar de mais, mas também não posso deixar que a angustia se apodere de mim e me leve para "o mais profundo fundo me mim próprio". E, a cada passo que dou, vigio-me para não me deixar levar pelo lirismo da poesia do sonho e tento agarrar-me ao puro realismo que depressa se transforma numa nova objectividade.
Afinal, que é o realismo? o que é o real? Somos nós que o criamos para nós mesmos. Não conseguimos separá-lo das nossas visões oníricas nem das nossas depressões momentaneas ou constantes. Assim, essse real é para mim como o não é para mais ninguém. A minha certeza é a tua duvida e nunca haverá consenso, só meras especulações e os factos... que são o passado ou o presente, que já passou.
E com os olhos postos nos meus pés não olho para o sol nem para a lua, e vou-me arrastando. E onde é que está a realidade nisto?

Thursday, October 06, 2005




"I wish I was a messenger
and all the news was good"





Wishlist by Pearl Jam

Wednesday, October 05, 2005

The blue bus is calling us!

Persegue-me esta lembrança de momentos passados pela musica das palavras. Embalados pelos sons agri-doce de intermináveis histórias a 4 vozes, deixávamo-nos ir na leveza do compasso das nossas batidas cardíacas.
Queria fugir outra vez para o deserto, e esperar que o "blue-bus" nos chamasse para as nossas viagens sem rumo. Parece que vejo outra vez esses momentos intermináveis. Não havia tempo nem espaço para mais ninguém, o mundo paráva a ver-nos avançar cada vêz mais. E nunca deixávamos de avançar.
Mas perdemos o nosso "blue-bus" em esperas longas, em atrasos, em desencontros, em mal-entendidos, em faltas de compreensão, em ausência de tempo, em esquecimentos, em lágrimas, em risos, em obrigações e em merdas! Ou talvêz nos tenhamos enganado no autocarro...

Tuesday, October 04, 2005

Lá está... aprendam!

Ás vezes acontece que no decorrer de uma conversa faltam as palavras. Sentimos que se prendem à boca com medo de sairem como balas de revólver. E ficamos com toda uma enchurrada de ideias presas ao cérebro e a congestionar a garganta. É, de facto, constrangedor
Mas ainda pior são aquelas pessoas nessas alturas usam este terrível, irreflectido e irritante "desentupidor"de gargantas:"Reamente" (normalmente aniquilam o l, sem dó nem pudor). RRRRRRRRRRR!!! antes ficassem com as ideias todas na boca até rebentarem!
Vê-se mesmo que esta gente não conheçe a subtileza elegante e inteligente de um "lá está"

electric chair

"Some die just to live..."

Immortality by Pearl Jam

Pinky and Brain

Monday, October 03, 2005

Hino ao ecletismo urbano

Louvemos a vida citadina, plena de enigmas e multiplicidades multlipas multiplicadas ao quadrado.
Unam-se em si mesmos os indivíduos e construam o seu mundo de castelos urbanos
Sempre se dividiram as coisas em categorias, está na altura das unir nas confusões cosmopolitas sem nexo nem lógica.
Ergam-se torres imensas com o perigo eminente de cederem ao seu próprio peso.
Recriem-se a cada minuto, inventem a todo o momento novos dogmas e regras que no momento seguinte pereçam perante a inconstancia deste Homem.
Morram, nasçam e resuscitem-se!
Nietszche é o meu Deus!
O paradoxo é o meu lema!

Quanto tempo tempo tem?

Pergunto-me se será uma circunstância adjuvada pela culpa e pela ausência, pergunto-me se será uma passagem demorada num tunél sem luzes de presença, pergunto-me se serão apenas uns copos a mais... O cruzamento de coordenadas tempo/espaço que nos fazem demorar nesta estação sombria.
Parece que as conquistas que fizemos ao longo destes anos se desvanecem no período de um sonho.. ou talvez pesadelo. E é estranho apetecer-me escrever nesta noite, quando deveria não escrever, quando nem sequer deveria ter motivo para isso.
Não consigo deixar de pensar no tempo, nesse colosso que nos esmaga e nos empurra para a frente. Será o tempo um aliado? Ou será simplesmente uma denominação atenciosa para palavras como espera? E quanto tempo vai demorar este tempo?
Conforme digito estas palavras estou a perder tempo porque está alguem a precisar do meu tempo, o meu pobre tempo. E enquanto me perco em divagações abstractas um problema bem concreto esconde-se na casa de banho, soltando ruídos abafados de socorro.
Espero que o tempo me traga a resposta?

Sunday, October 02, 2005

caféina, meu amor


Minha mesa no Café,
Quero-lhe tanto... A garrida

Toda de pedra brunida
Que linda e que fresca é!
(...)
Ou acendendo cigarros.,
- Pois há um ano que fumo -
Imaginário presumo
Os meus enredos bizarros.
(...)
Nos cafés espero a vida
Que nunca vem ter comigo:
- Não me faz nenhum castigo,
Que o tempo passa em corrida.
(...)
Cafés da minha preguiça,
Sois hoje - que galardão! -
Todo o meu campo de acção
E toda a minha cobiça.

in Cinco Horas de Mário de Sá-Carneiro

A revolta do artista

Quer eu queira, quer nao queira
esta cidade há-de ser uma fronteira e a verdade
cada vez menos, cada vez menos verdadeira

Quer eu queira quer não queira
no meio desta liberdade,
Filhos da puta sem razão e sem sentido.
No meio da rua nua, crua e bruta
eu luto sempre do outro lado da luta!

(...)

... o poder podre dos homens normais
está a tentar dar cabo de mim!!!

Nesta Cidade by Jorge Palma

Saturday, October 01, 2005

Desperate housewife


Beatrix Kiddo searching for revenge... she's the real desperate housewife!

Tabacaria

Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.

Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.

Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.

Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei de pensar?

Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!
Gênio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim.
Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim...
Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando?
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;
Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num poço tapado.
Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
O seu sol, a sua chava, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordamos e ele é opaco,
Levantamo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.

(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)

Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.

(Tu que consolas, que não existes e por isso consolas,
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!
Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)

Vivi, estudei, amei e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente

Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.

Essência musical dos meus versos inúteis,
Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.

Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o deconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,

Sempre uma coisa defronte da outra,
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.

Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.

Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.

Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando.
Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.

(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira.
Vou à janela.O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.

by Álvaro de Campos, 15-1-1928

Could it be better?


Johny Deep and Tim Burton united again to make guide us in a wonderfull trip to our childhood!

Fix you

When you try your best but you don’t succeed
When you get what you want but not what you need
When you feel so tired but you can’t sleep
Stuck in reverse

And the tears come streaming down your face
When you lose something you can’t replace
When you love someone but it goes to waste
Could it be worse

Lights will guide you home
And ignite your bones
And I will try to fix you

And high up above or down below
When you’re too in love to let it go
But if you never try you’ll never know
Just what you’re worth

Lights will guide you home
And ignite your bones
And I will try to fix you

Tears stream down your face
When you lose something you cannot replace
Tears stream down your face
And i…

Tears stream down your face
I promise you I will learn from my mistakes
Tears stream down your face
And i…

Lights will guide you home
And ignite your bones
And I will try to fix you

By Coldplay

desde sempre e para sempre, sempre que for preciso

minarete de luar


Por vezes parece mesmo que perdi o calor do sol, por vezes chego a ter a impressão que o sol se foi, deixou-me aqui com pés gelados e com os dentes a fazerem de triturador.
Nessas alturas recorro à sabedoria popular e lembro-me que "quem não tem cão, caça com gato". Por isso se o sol se pôs... viro-me para a lua.